quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Extracto do livro "Tanto que eu não te disse" - Marta Gautier






- Gostas de mim? - Gosto. - Gostas como? - Gosto de estar contigo. De falar contigo. - Queres namorar? - Não.
- Porquê?
- Porque já não ia ser igual.
- Igual?
- Sim. Igual ao que temos agora.
- Porquê?
- Porque o princípio é sempre a parte melhor.
- Queres ficar sempre no princípio?
- Se for possível...
- Então, não queres ter ninguém para sempre...
- Talvez não.
- És complicada.
- Se não namorar sou menos.
- Tens medo que eu não goste da tua complicação?
- Tenho a certeza que não vais gostar.
- Como é que sabes?
- Porque acho que conheço alguma coisa das pessoas.
- Achas?
- Talvez.
- E do amor?
- Conheço pouco.
- Então, também não podes conhecer muito das pessoas.
- Talvez tenhas razão, mas não me apetece discutir isso agora.
- Então o que queres discutir?
- Nada. Só ficar assim a olhar para quem passa e falar de banalidades.
- Queres falar de banalidades para sempre?
- Não. Podemos falar de assuntos importantes, desde que não seja sobre nós.
- Assim não vão ser importantes.
- Para ti é essencial falar de nós?
- É.
- Para quê?
- Porque gosto de ti. Achas pouco?
- Acho muito. Por isso não vamos deitar tudo a perder.
- A perder?
- Sim. Se começamos a falar de nós fica tudo complicado e os problemas aparecem.
- Problemas como?
- Vais querer saber como foi a minha vida. Vamos cobrar um ao outro. Vais querer fazer amor comigo só porque achas que tens direito.
- Direito? Só fazemos amor se quiseres!
- Mentira. Só dizes isso porque estás muito romântico agora, mas depois... Depois vais começar a tocar-me, a sentir desejo...
- E então?
- Então? Então eu vou sentir-me na obrigação de fazer amor contigo para que não me aches esquisita.
- Tu fazes amor para que não te achem esquisita?
- Faço amor para me acharem normal. Dá-me um cigarro.
- Estás nervosa?
- Sim. Estou a fazer um esforço por ser sincera e não estou habituada.
- Não gostas de sexo?
- Mais ou menos.
- Então?
- Sinto-me a pecar quando o faço.
- A pecar?
- Sim. Como se estivesse a fazer qualquer coisa contra Deus ou contra os meus pais. A pior parte é quando acaba. A outra pessoa fica feliz e eu com vontade de chorar. Às vezes choro e digo que é de emoção, mas é mentira. Depois visto-me logo. Sinto-me suja quando estou nua. Não gosto de me ver nua.
- Não?
- É uma sensação estranha. O sentimento de pecado. Só estou bem quando estou vestida.
- Deves sofrer com isso.
- Muito. Gostava de sentir aquela beleza, aquela transcendência de que todos falam quando descrevem o sexo. Sinto-me uma prostituta.
- Porque é que achas que isso acontece?
- Deve ter a ver com o facto de me terem culpado tanto por me terem visto aos beijos com um rapaz quando era muito nova. A partir daí, acreditei que tudo o que tivesse a ver com o sexo oposto e com o corpo tinha de ser em segredo e era pecado. Acho que desde esse dia me sinto uma puta clandestina que é desmascarada cada vez que se deita com alguém. Acho que é isso. Sinto-me sempre uma puta.
- Por isso é que dizias que ias fazer comigo por obrigação?
- Talvez. As putas fazem porque tem de ser. Não há prazer, mas elas fingem.
- Tu finges?
- Sim.
- Se não queres namorar comigo porque me contas tudo isso?
- Exactamente por não querer namorar contigo é que te conto. Com este desabafo já ficou definido que somos amigos. Além disso, deves ter passado a achar-me estranha, por isso vais preferir ser meu amigo a namorar.
- Então só desabafaste para fazer definições... Foi também uma obrigação. Tiveste prazer em contar-me essas coisas?
- Não muito. Ainda nos conhecemos há pouco tempo.
- Então para que te obrigaste a contar?
- Para ver se conseguia falar sobre o assunto e para ver se me sabia bem.
- Então forças-te? Assim como te forças a fazer amor. Tu violas-te, sabias?
- És capaz de ter razão.
- Estás a chorar?
- Quase.
- Fui muito duro contigo.
- Não. Eu é que fui dura comigo. Vou-me embora. Não sei lidar comigo, quanto mais contigo...

2 comentários:

Anónimo disse...

Hj resolvi passar por cá e, mais uma vez, nao consegui deixar de ser indiferente a este texto. como tal tinha de deixar cá o meu testemunho :P

Este texto é lindo, presumo que todo o livro o seja ,(infelizment inda nao o li hihi)..
Inda nao encontrei um outro texto com que me identificasse tanto :s

Boa sorte com este blog ;P
p.s: Tens feito boas escolhas nos textos que aqui tens postado..

jokitas gandesssssssss (",)

Anónimo disse...

este texto e' me familiar.
tenho conversas do genero, as vezes...xD

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